A partir desta quarta-feira (6), entram em vigor as tarifas de 50% sobre produtos brasileiros importados pelos Estados Unidos, que foram anunciadas pelo presidente Donald Trump no início de julho. A medida, postergada em cinco dias, e motivo de tensões diplomáticas entre os dois países nas últimas semanas, marca um novo momento na economia do país e nas relações com os EUA.
A ordem executiva, assinada no dia 30 de julho por Donald Trump, implementou a tarifa adicional de 40% sobre o Brasil, o que eleva o total da tarifa para 50%, já que uma tarifa de 10% já estava em vigor anteriormente. O documento dizia que as medidas passavam a valer sete dias depois da assinatura, dessa forma, as tarifas de importação para produtos brasileiros passam a ser de 50% a partir desta quarta.
Isso significa que, se uma empresa dos EUA estiver importando, por exemplo, um carro por R$ 100 mil e houver a tarifa de 50%, ela pagará R$ 50 mil de imposto, por unidade.
A tarifa é responsabilidade da empresa importadora, localizada no país que decidiu aumentar a cobrança, e pesa no bolso do consumidor, que paga mais caro pelos produtos. O objetivo desse tipo de medida é fazer com que os preços dos produtos importados fiquem mais caros e percam competitividade em relação a produtos vindos de outros países ou fabricados dentro dos EUA.
O governo americano alegou, entre os motivos para a adoção da tarifa, práticas do governo brasileiro que estariam prejudicando empresas americanas, violando direitos de liberdade de expressão de cidadãos dos EUA e comprometendo interesses estratégicos do país.
Efeitos já são sentidos em SC
Pablo Felipe Bittencourt, economista-chefe da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), explica que os efeitos da medida já estão sendo sentidos no Estado, com diminuição dos pedidos e redução dos embarques por conta da expectativa negativa em relação à aplicação das tarifas. Ao longo dos próximos anos, a Fiesc prevê uma queda no PIB de Santa Catarina.
— Para o Estado, a estimativa que se tem é de uma perda de PIB em torno de 0,3% para o espaço de um ano e meio a dois anos, então é um impacto pronunciado numa economia que cresce mais ou menos 3,5%, 4% ao ano — pontua Pablo.
As tarifas devem ter um maior impacto em alguns setores econômicos específicos, como o de produtos de madeira e produtos de móveis, localizados na região Norte, Nordeste e Serrana do Estado.
— Muitas empresas desse setor estão com problemas grandes, muitas delas estão em quase 100% da produção voltada para o mercado dos Estados Unidos. Eles atendem o mercado imobiliário, então você está tendo lá uma redução drástica de pedidos e eles não vão conseguir exportar — explica o economista-chefe da Fiesc.
Algumas empresas já estão demitindo ou dando férias coletivas para os trabalhadores, o que traz impactos para o encadeamento da produção e para todos os produtores que dependem das empresas exportadoras.
Outros setores citados entre os mais impactados estão os de máquinas, motores e geradores elétricos, compressores, motobombas, que terão tarifas adicionais de 50%, assim como carnes, mel, pescado.
— Grande parte da nossa produção de mel vai para exportação pros Estados Unidos, então a gente vai ter um impacto grande nesses produtores, que produzem essas regiões mais altas, em que o mel tem uma qualidade diferenciada — afirma.
Impactos no bolso
O tarifaço de Trump também deve ser sentido em alterações de preços para os consumidores em Santa Catarina. Pablo Bittencourt explica que os produtos que não consigam ser vendidos para os Estados Unidos têm o mercado brasileiro como primeira opção, o que traz como consequência um nível de redução de preços no curto prazo.
— A gente deve assistir isso claramente no mercado de café e frutas, por exemplo. Isso não significa um processo muito benigno de inflação, mas um impacto de curto prazo no nível de preços que pega tanto consumidores finais, por causa desses bens do tipo café e frutas, mas também os produtores de meio de cadeia, no caso de madeiras, máquinas e afins — explica.
O economista-chefe da Fiesc aponta que as empresas têm relatado busca de outros mercados para tentar dar vazão a esses produtos, tanto dentro do Brasil quanto no exterior. Entidades como a Fiesc têm atuado junto ao governo do Estado para apoiar na elaboração de medidas fiscais e financeiras que possam atenuar esses impactos.
Relembre a linha do tempo do tarifaço
A aplicação de tarifas de 50% sobre os produtos brasileiros importados pelos Estados Unidos foi anunciada no dia 9 de julho, em uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) compartilhada na rede social de Donald Trump, a Truth Social.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou que as tarifas serão respondidas “à luz da Lei brasileira de Reciprocidade Econômica”, e destacou a soberania brasileira. Desde então, teve início uma escalada de tensões diplomáticas entre os dois países e não houve uma conversa direta entre as lideranças.
No dia 30 de julho, o presidente Donald Trump assinou a ordem executiva que oficializa a imposição das tarifas adicionais. Uma lista de quase 700 produtos ficou isenta das tarifas, entre eles aeronaves, suco de laranja, fertilizantes, madeira e outros. A medida foi encarada como uma “desidratação” do tarifaço e trouxe alívio a segmentos econômicos brasileiros.
No decreto que confirmou a aplicação do tarifaço contra produtos brasileiros, ficou definido para 6 de agosto a data de início da sobretaxa. Na mesma data da assinatura, o governo dos Estados Unidos anunciou a aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
Todos os eventuais bens de Moraes nos EUA foram bloqueados, bem como qualquer empresa ligada a ele. O ministro também ficou proibido de realizar transações com cidadãos dos EUA, utilizando cartões de crédito de bandeira americana, por exemplo.
O que escapou do tarifaço
A lista de produtos isentos, considerados exceções à regra, foi divulgada junto com o decreto oficial assinado pelo presidente Donald Trump:
Setor aeronáutico (aeronaves civis, peças e motores, o que pode beneficiar a Embraer, que tem quase metade dos jatos comerciais negociados com os EUA);
Setor automotivo (veículos de passageiros, caminhões leves, peças e componentes, o que beneficia montadoras brasileiras que exportam aos EUA);
Setor de energia (combustíveis como carvão, gás natural, petróleo, querosene, óleos lubrificantes e outros, incluindo energia elétrica);
Parte do agronegócio (suco e polpa de laranja, castanha-do-brasil, madeira tropical serrada ou lascada, polpa de madeira, fios de sisal e fertilizantes; outros itens do agro como café e frutas seguem sujeitos à sobretaxa);
Mineração e metais (silício, alumina, ouro, prata, ferroníquel, além de produtos semiacabados e componentes industriais de ferro, aço e alumínio e cobre);
Eletrônicos (smartphones, antenas, aparelhos de gravação e reprodução de som e vídeo);
Bens em trânsito, que já estavam a caminho dos EUA, de uso pessoal e doações.
O que continuará no tarifaço
Café;
Carne bovina;
Frutas;
Produtos têxteis;
Calçados;
Móveis.
Uma pesquisa realizada pela Fiesc mostra que, de forma geral, os principais produtos da pauta exportadora de Santa Catarina não estão na lista de produtos isentos. A presidente da Câmara de Comércio Exterior da FIESC, Maria Teresa Bustamante, afirma que, contudo, a situação dos exportadores de SC deve ser avaliada caso a caso, por conta da longa lista de exceções.
— Os produtos de madeira e derivados, como móveis, que lideram as exportações catarinenses para os Estados Unidos, estão sob investigação. Até o fim da investigação, essas mercadorias seguem sendo tarifadas com alíquotas anteriores ao anúncio do tarifaço — explica Maria Teresa.
Ela também explica que o segmento de veículos e autopeças, segundo a lista dos principais produtos, tem taxa fixada em 25%, a mesma para todos os países do mundo, sem a sobretaxa de 50%.
— A lista de produtos isentos é extensa e muito particular. Um setor pode ter produtos dentro e fora da lista. Cabe à indústria avaliar com cuidado o documento e identificar possíveis exclusões considerando a classificação de cada um de seus produtos conforme a Comissão de Comércio Internacional dos EUA — detalha a presidente da câmara.